700.000 hectares. Essa é a extensão, aproximada, das áreas que abrigam manguezais no território brasileiro, atualmente. O Brasil possui a maior área de mangue da América Latina e, recentemente, descobriu-se que a maior de todo o planeta, segundo a FRAM (Fundação Rede Amazônica). Apesar de dispor deste privilégio, o país, ainda, pouco explora seu potencial e, assim, engatinha no quesito preservação e utilização de seu serviços ambientais de forma sustentável.
Não é de hoje que institutos ambientalistas e ONGs buscam promover a inserção dos conhecimentos e importância desse bioma através de projetos socioambientais e culturais em todo o território nacional. Entretanto, nos últimos anos, esse abundante ecossistema tem despertado a atenção e interesse de pesquisadores e grandes veículos internacionais.
Mangue como tema global
Recentemente, a revista do grupo National Geographic investiu e conduziu uma expedição inédita que percorreu a extensão do Rio Amazonas de suas nascentes nos Andes até a Foz, no Oceano Atlântico. Batizada como Expedição Perpetual Planet, a iniciativa partiu do interesse em entender o dinamismo desse bioma único e extremamente peculiar em sua totalidade, partindo dos princípios biológicos até sua importância e responsabilidade social.
Liderado pelos pesquisadores Angelo Bernardino e Margaret Awuor Owuor, o estudo revelou os múltiplos benefícios que ultrapassam as funções ambientais. A pesquisa expôs fatores sociais, econômicos e culturais desse ecossistema na região da costa litorânea. Em entrevista para a revista Veja, os especialistas relataram que, diferentemente, da floresta amazônica, a maioria da população conhece pouco os manguezais -especialmente pessoas que moram longe da costa.
Importância Climática
O estudo se concentrou em 13 cidades costeiras, especialmente no norte do Pará. E notou-se que, além do papel vital às comunidades locais, os mangues desempenham importantes funcionalidades a regulação térmica do ambiente. Os solos dos manguezais são eficazes sumidouros de carbono, retirando grandes quantidades do gás da atmosfera, torna-se um grande aliado às mudanças climáticas e, consequentemente, ao aquecimento global.
“Foi somente na última década que o Brasil começou a intensificar as visitas de pesquisa para conhecer os manguezais, sua importância, inclusive na luta contra as mudanças climáticas, e sua beleza”, afirma o Professor de Oceanografia da Universidade Federal do Espírito Santo.
A partir da Perpetual Planet, os estudos se aprofundaram e acabou se estendendo para um artigo científico da revista suíça Frontiers in Environmental Science, alargando a relevância da temática mundo a fora.
Além do meio ser uma essencial fonte de alimentos; suscitar atividades e expressões culturais; renda; educação e regulação climática, os mangues são grandes agentes responsáveis pelo controle de inundações nas áreas continentais. Dessa forma, sobram motivos para os tomadores de decisões e grandes órgãos investirem em sua melhor exploração e, principalmente, preservação.
Manguezais Capixabas
O Espírito Santo, nasceu sobre as raízes aéreas dos manguezais. O estado abriga a 4ª maior extensão de manguezais do Brasil, somando uma área total de, aproximadamente, 8.687 hectares. Esse valor equivale a aproximadamente 120 campos de futebol, e a capital Vitória -segundo a prefeitura- corresponde ao maior manguezal em perímetro urbano da América Latina. Quase 10% do território da Capital é ocupado por manguezais.
Em entrevista com Iberê Sassi, fundador e atual presidente do Instituto GOIAMUM, o especialista afirmou que se preocupa muito com este distanciamento da população com relação aos manguezais, especialmente na região sudeste-sul. “Nossas principais capitais se instalaram e se desenvolveram nessas áreas e, desde sempre, consideraram os manguezais como área suja, fedida e própria para o descarte de esgoto, lixo e toda sorte de resíduos, especialmente no passado. Hoje, novas leis e regulamentações estão dificultado a destruição e ocupação dessas áreas extremamente sensíveis.”, afirma.
O fundador do Instituto ressalta, também, que para os capixabas o mangue é, de longe, o maior fornecedor de serviços ambientais -se comparado com qualquer outro ecossistema. Segundo ele, o manguezal fornece mais de RS 80.000,00 por ha/ano em forma de absorção e fixação de carbono. Além disso, abriga um berçário de centenas de espécies explotáveis e produção de crustáceos e mariscos. Sem falar nos demais impactos socioculturais espírito santenses, como o aproveitamento de casca das árvores para produção de tanino, a inserção do turismo e a inspiração cultural.
Impactos no aquecimento global
Para além dos fatores de importância do bioma, a gastronomia típica do estado, também, está diretamente atrelada a preservação dos mangues. A tradicional torta capixaba advém de carangueijos desse ecossistema.
“A inspiração cultural na tradição Capixaba é, talvez, o mais significativo: Paneleiras, Desfiadeiras de siri. Se o manguezal continuar a ser ocupado, poluído e destruído essas tradições morrerão.” se preocupa, Iberê.
Quando questionado sobre os impactos climáticos e a participação do bioma sob eles, Sassi afirma que os efeitos das mudanças climáticas são muito graves para o manguezal, especialmente devido as secas ou inundações. Isso porque o manguezal depende do equilíbrio entre água doce e salgada sujeitos ao, natural, vai e vem das marés. Além disso, aponta que as pessoas, diretamente, mais afetadas serão os ribeirinhos, pescadores artesanais, catadores de caranguejo, siri e marisqueiros em geral.
“Só para se ter uma ideia, no último grande tsunami na Sumatra (Indonésia), em 2004, imensas áreas que eram cobertas por florestas de mangue sofreram muito pouco ou nada sofreram devido ao amortecimento da velocidade e intensidade da água, protegendo milhares de pessoas”
Nesse cenário, Sassi afirmando que -embora com baixa probabilidade- só a costa atlântica está protegida de um eventual tsunami nas costas do Amapá, Pará e Maranhão. O resto de nossa costa está relativamente desprotegida.
Caminhos para um futuro sustentável
Além disso, Iberê alerta, ainda, que a grande Vitória estar situada no maior mangue urbano do Brasil pode não ser mais um fato palpável. Isso porque em 500 anos de ocupação, destruição, aterramento e urbanização esse pódio pode não ser mais real ou pode estar com os dias contados.
Seguindo o ranking de localização de maiores manguezais urbanos, encontra-se Recife, e Florianópolis, segundo o estudioso. “Seria bom se nós competíssemos pelo “maior manguezal protegido” do Brasil, das Américas e do mundo. Aí sim seria uma competição saudável.”, afirma.
Para Sassi o caminho da preservação do bioma está na educação da população. Ele crê que só assim veremos um futuro digno e atado a um desenvolvimento sustentável do ecossistema.
“Chamo a atenção para uma melhor definição do ecossistema manguezal: um local que ocorre sempre na foz de um rio, sujeito às variações de maré que abrange canais, bosques de até 5 espécies de árvores, áreas sujeitas às marés de sizígia -formadoras de apicuns, marismas e salgados. Portanto, em primeiro lugar: Proteger. Em segundo: Cuidar. Em terceiro: Educar.”
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