Além dos números: como o clima molda a migração humana

Estudo da Nature Communications mostra que mudanças climáticas afetam a migração de forma diferente dependendo de idade e educação

Migração Climática
Foto: Freepik/divulgação -

Por Fernanda Zandonadi

Um novo estudo publicado na revista Nature Communications, em setembro de 2025, revela que as mudanças climáticas influenciam a migração de pessoas de maneira muito particular. Intitulado “A migração climática global é uma história de quem e não apenas de quantos”, o trabalho dos pesquisadores Hélène Benveniste, Peter Huybers e Jonathan Proctor destaca que idade e nível de educação dos migrantes são fatores cruciais para entender quem se desloca por causa do clima, mais do que simplesmente contar quantas pessoas migram.

Por que o clima afeta a migração?

Eventos climáticos extremos, como as inundações que deslocaram 33 milhões de pessoas no Paquistão em 2022 ou o aumento da migração de áreas rurais da América Central para os Estados Unidos, mostram que o clima pode tanto incentivar quanto dificultar a migração. Por exemplo, secas ou calor intenso podem fazer as pessoas quererem deixar suas casas, mas também podem deixá-las sem recursos para se mudar. Para entender melhor essa relação, os pesquisadores desenvolveram um método que combina análise de dados com testes rigorosos, usando informações de 168 países sobre migrações internacionais e 71 países sobre deslocamentos internos, coletadas entre 1988 e 2019.

Quem migra e por quê?

O estudo descobriu que as pessoas reagem de forma diferente às mudanças climáticas dependendo de sua idade e escolaridade. Por exemplo:

  • Adultos mais velhos com menos educação tendem a migrar mais quando enfrentam calor ou seca, possivelmente porque têm mais recursos acumulados para se deslocar.
  • Jovens com baixa escolaridade muitas vezes ficam “presos” em suas regiões, sem meios para migrar, mesmo diante de condições climáticas extremas.
  • Em áreas tropicais, o calor aumenta a migração de pessoas com maior escolaridade, enquanto em regiões secas e quentes, a seca motiva mais os menos escolarizados a se moverem.

Essas diferenças mostram que não basta contar quantas pessoas migram. É essencial entender quem elas são para criar políticas eficazes.

Um método mais confiável

Os pesquisadores usaram dados detalhados sobre migração, como idade, sexo e educação, combinados com informações climáticas, como temperatura e umidade do solo. Eles testaram seus modelos para garantir que as previsões fossem confiáveis, descobrindo que considerar a demografia melhora em até cinco vezes a precisão das projeções, comparado a abordagens que tratam todos os migrantes como iguais.

O futuro da migração climática

O estudo projeta que, até o final do século, as mudanças climáticas terão impactos muito maiores na migração quando se considera quem são os migrantes. Por exemplo, em um cenário médio de aquecimento global, as taxas de migração podem variar de -31% a +26% dependendo do grupo demográfico, em vez de mudanças pequenas (-5% a +1%) previstas por modelos mais simples. Isso significa que algumas pessoas migrarão muito mais, enquanto outras ficarão ainda mais limitadas.

O que isso significa para as políticas públicas?

Os resultados apontam para um desafio: as pessoas mais afetadas pelas mudanças climáticas, como as menos escolarizadas, muitas vezes não conseguem migrar, enfrentando uma “dupla penalidade”. Políticas públicas precisam considerar essas diferenças, oferecendo apoio para quem deseja ficar em suas regiões ou facilitando a migração para quem precisa se deslocar.“Não se trata apenas de quantas pessoas migram, mas de quem elas são”, explica Hélène Benveniste. “Políticas eficazes devem ajudar os grupos mais vulneráveis, que muitas vezes ficam presos onde estão.”

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