Agroforestry Carbon capta R$ 1 milhão para vender serviços das agroflorestas do Brasil na Europa

Startup focada em compensação ambiental com impacto social planeja expansão após pular de R$ 56 mil para R$ 2 milhões em faturamento em apenas um ano

Gabriel Neto e Clara Johannpeter, da startup Agroforestry Carbon. — Foto: Divulgação -

Na corrida pela diminuição de gases de efeito estufa na atmosfera, grandes iniciativas de regeneração florestal vêm despontando no Brasil, movimentando bilhões de reais em créditos de carbono em uma verdadeira indústria de plantio de árvores nativas. Paralelo a esse movimento, startups de sistema agroflorestal complementam o cenário com projetos focados no impacto, melhorando a qualidade de vida de agricultores com áreas menores, produzindo alimentos de alta qualidade e movimentando milhões de reais.

A Agroforestry Carbon é um exemplo deste nicho e seu potencial de crescimento rápido. A empresa pulou de um faturamento inicial de R$ 56 mil em 2022 para R$ 2,5 milhões no ano passado, e agora arrisca uma expansão na Europa em busca de clientes com cheques maiores.

Em vez de seguir o caminho dos créditos de carbono, que requer investimentos de milhões na aprovação de projetos, compra de áreas e capacitação de pessoal, por exemplo, a startup com base em Santa Catarina se coloca como um intermediador entre empresas que precisam compensar suas emissões e agricultores com prática comprovada em sistemas agroflorestais (SAF). Atualmente são quase 500 propriedades rurais parceiras, produzindo sete toneladas de alimentos ao ano. A meta é chegar a 70 mil agricultores cadastrados até 2030.

Ano após ano, estudos vêm enfatizando a produtividade da agrofloresta. Neste mês de agosto, o Instituto Escolhas publicou pesquisa que aponta que apenas na parte degradada de terras indígenas no país (1,3 milhão de hectares), os SAFs gerariam uma receita anual de R$ 153 bilhões em produtos agrícolas como frutas e legumes, com potencial de produção de 10 milhões de toneladas de alimentos por ano. O Brasil tem a meta de recuperar 12 milhões de hectares de florestas degradadas até 2030.

Raio-X Agroforestry Carbon

  • 470 propriedades agroflorestais parceiras
  • 205 famílias de agricultores impactadas
  • 387 hectares de sistemas agroflorestais
  • 280 mil árvores plantadas
  • 583 espécies diferentes de plantas
  • 6.996 toneladas de alimentos

Fonte: Relatório de Impacto 2023

Mais R$ 1 milhão em caixa

Agosto foi o mês de conclusão da primeira rodada de investimento da startup, que finalizou arrecadando R$ 1,08 milhão, vindo de 101 investidores diferentes. A empresa optou por uma modalidade de investimento em que os interessados podiam entrar no negócio com aportes pequenos, a partir de R$ 1.000.

Assim, a opção mirou um investidor que, além do lucro, buscasse também uma motivação maior. “Várias pessoas questionaram a escolha de financiamento, mas acho que foi uma escolha muito legal, pois quando a gente fala de impacto, ter pessoas advogando pela causa é muito importante”, explica a diretora de operação, Clara Johannpeter.

Esse dinheiro é o segundo aporte da história da empresa. Ela operou em seus dois primeiros anos com o investimento-anjo de R$ 300 mil da Regenera Ventures. Essa investidora é ligada ao grupo Viva Regenera, de produtos de origem natural. O CEO da Agroforestry, Gabriel Neto, literalmente bateu na porta dos investidores durante um passeio de bicicleta em Palhoça (SC). Ele nem sabia exatamente do que se tratava. Viu a palavra “regenera” no letreiro, pensou que ia achar um cliente, e acabou com seu primeiro investidor.

A verba dos novos investidores deve estruturar o aumento de escala nos negócios da empresa. Dessa forma, pretende expandir sua atuação para 100 mil hectares até 2030. Além disso, conta com potencial de produção de 900 mil toneladas anuais de alimentos e um plantio total de 10 milhões de árvores. Então, a Europa é um passo importante nesse caminho, explica Neto. “É onde vamos nos transformar em unicórnio”, aposta, com uma agenda que inclui pítches em bancos, instituições de governos e também ONGs na Holanda, primeiro mercado aberto pela startup no Velho Mundo. A ideia é compensar no Brasil o carbono emitido por companhias europeias, trazendo esse recurso para os pequenos agricultores parceiros.

Quatro frentes de negócio da Agroforestry Carbon

O mais recente produto da empresa, em fase de desenvolvimento no time de tecnologia, é o rastreamento dessa cadeia de suprimentos, que todo o projeto da Agroforestry Carbon ajuda a fomentar. Uma vez que possui controle digitalizado sobre tudo que produz em suas agroflorestas, o próximo passo será acompanhar esses alimentos colhidos. Assim, passa a explorar oportunidades comerciais. Essas oportunidades podem estar tanto na medição de emissões de escopo 3, por exemplo, para empresas que querem cortar o impacto também de seus fornecedores, quanto entregar produtos ao consumidor com garantia de origem, com a possibilidade de selos atestando a neutralidade de carbono, por exemplo, além do cultivo orgânico.

“Falar em cadeias produtivas é importante, pois precisamos de empresas consumindo e fazendo produtos de floresta, e não de monocultura. Quando a gente fala de cadeia, fala na verdade de gerar incentivos econômicos para que a floresta fique em pé, para que as pessoas vivam de floresta. Quanto mais marcas fazendo produtos com matéria-prima de floresta, e não fontes esgotáveis, mais florestas vamos ter preservadas, por isso trazer o supply chain, temos que conectar a indústria e gerar matéria-prima de florestas para gerar produtos florestais”, analisa Johannpeter.

A Agroforestry Carbon entrou no mercado como provedora de projetos de compensação. Assim, ela vem administrando serviços florestais, no caso, os SAFs, pagos por companhias que precisam abater suas emissões de gases intensificadores do aquecimento global e dos eventos extremos das mudanças climáticas. Além de fornecer agroflorestas com selo de certificação, em que todo esse processo é auditado e certificado, a startup faz o levantamento das emissões das companhias clientes, e assim oferece projetos que equivalem ao impacto ambiental negativo registrado. Além disso, a equipe atende a projetos personalizados, sob encomenda.

“É importante salientar o foco em resolver problemas crônicos de desigualdade, uma crise alimentar pior que a climática, em que ficamos ou sem comida ou com comida envenenada. É algo que atinge a todos, independentemente da classe social, e a agrofloresta trabalha as duas crises em suas duas frentes, social e ambiental”, destaca o CEO.

Atuação da Agroforestry Carbon se espalha por cinco biomas do país. No detalhe, número de árvores plantadas em cada região. — Foto: Divulgação

Desafio da credibilidade

O mercado de soluções baseadas na natureza, especialmente no nicho do crédito de carbono, vem sendo questionado há anos. Isso acontece pela dificuldade em medir seu impacto real na diminuição de gases estufa. Além disso, por ser uma forma de empresas poluidoras pagarem seus “pecados” sem de fato, diminuírem suas emissões.

Escândalos no Brasil, como a recente descoberta de uma quadrilha que teria movimentado R$ 180 milhões usando terras públicas na Amazônia, abalam a confiança e o bolso de investidores. Enquanto isso, analistas afirmam que há um lado bom, quando as más práticas são reveladas e coibidas.

No caso da Agroforestry Carbon, a qualidade dos créditos oferecidos, que seriam melhor enquadrados como créditos de sociobiodiversidade, considerando redução de emissões e também a geração de impacto social e na produção de alimentos saudáveis, é feita a partir de investimento em tecnologia.

A startup mantém uma equipe dedicada ao monitoramento de dados geoespaciais. Assim, ela analisa a evolução das agroflorestas cadastradas usando imagens de satélite. Dessa forma, permitem também analisar possíveis irregularidades de terreno, como instruções em áreas indígenas e terras públicas. A análise de documentação de parceiros em potencial compõe, então, o processo de cadastro. Ela conta também com times contratados para atender todas as regiões e biomas do Brasil, sendo que a empresa atua em todos. “Sabemos a data do plantio, espécies, nome do agricultor, da propriedade, dados futuros de incremento de biomassa, índice de vegetação, análise da propriedade, cadastro rural, tudo que possa dar credibilidade”, explica Neto.

“Nossa diferença é que nosso foco é impacto, valor real, economia real, e colocar recursos financeiros, educacionais e emocionais para quem realmente está regenerando, em vez de fazer grandes áreas. Sempre temos coisas para ser melhoradas, e a tecnologia está ajudando com rastreabilidade e confiança”, avalia a diretora de operações.

Fonte: Marco Britto / Um Só Planeta

Receba as principais notícias sobre sustentabilidade no seu WhatsApp! Basta clicar aqui