A adoção das finanças sustentáveis por bancos e investidores representa uma mudança estrutural na forma como o risco e o retorno são avaliados no sistema financeiro. Na prática, isso significa que critérios ambientais, sociais e de governança deixam de ser considerados apenas valores éticos ou reputacionais, avalia Valdir Brunelli Valério Júnior, coordenador geral adjunto do Hub ES+ MCI/Funcitec pela Fapes e mestre em administração e contabilidade pela Fucape na linha de pesquisa Governança e Estratégia.
“Bancos e investidores deixam de avaliar as empresas apenas por indicadores financeiros tradicionais, como lucro, endividamento e capacidade de pagamento, e passam a incorporar riscos climáticos, ambientais, sociais e de governança como fatores que podem gerar perdas financeiras reais no curto, médio e longo prazo”.
Finanças sustentáveis
Tradicionalmente, a análise financeira se baseava em indicadores como lucro, endividamento, fluxo de caixa e capacidade de pagamento. Com a incorporação das finanças sustentáveis, novos fatores entram oficialmente na equação econômica.

“Isso quer dizer que bancos e investidores passam a perguntar, por exemplo, se eventos climáticos extremos podem interromper a operação ou aumentar os custos? Mudanças regulatórias ambientais podem gerar multas, impostos ou necessidade de investimentos não previstos? A empresa depende de insumos ou cadeias produtivas vulneráveis a questões ambientais ou sociais? Há riscos reputacionais que podem afetar vendas, contratos ou acesso a crédito? A governança é capaz de antecipar e gerenciar esses riscos?”, aponta.
As respostas a essas questões impactam diretamente o retorno esperado e o nível de risco assumido pelos financiadores. Empresas mais expostas a riscos climáticos ou regulatórios tendem a enfrentar crédito mais caro, exigências contratuais mais rígidas ou até restrições de acesso a financiamento. Por outro lado, organizações que demonstram capacidade de gestão desses riscos podem obter melhores condições, atrair investidores e reduzir o custo de capital.
A consolidação de padrões internacionais reforça essa mudança. “Com a adoção de padrões como as IFRS S1 e S2, esses riscos deixam de ser tratados como ‘externalidades’ e passam a integrar oficialmente a análise financeira. As empresas precisam demonstrar, com dados e métricas, como identificam, gerenciam e incorporam esses riscos à sua estratégia”.
Mudança estrutural
Valdir Brunelli Valério Júnior salienta ainda que as IFRS S1 e S2 representam uma mudança estrutural. “A sustentabilidade deixa de ser um relatório separado e passa a integrar o núcleo da informação financeira. Isso cria um novo padrão de transparência, comparabilidade e responsabilidade corporativa. Para empresas, o desafio é adaptar processos, sistemas e governança. Assim, para investidores, é uma oportunidade de alocar capital de forma mais consciente e eficiente, considerando riscos que antes ficavam fora do radar. No fim, finanças sustentáveis não são uma tendência passageira, mas uma evolução natural do próprio conceito de risco e valor econômico”, conclui.
IFRS S1 e IFRS S2 são normas internacionais criadas para padronizar a forma como as empresas divulgam informações sobre sustentabilidade e clima ao mercado financeiro. O objetivo é garantir que riscos e oportunidades ligados a esses temas sejam tratados como fatores econômicos concretos, capazes de afetar resultados, valor de mercado e decisões estratégicas, e não apenas como questões reputacionais ou discursivas.
IFRS S1 E IFRS S2
A IFRS S1 trata da divulgação de riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade de forma ampla. Ela orienta as empresas a informar como fatores ambientais, sociais e de governança podem impactar financeiramente o negócio no curto, médio e longo prazo. Isso inclui explicar quais são esses riscos, como eles afetam receitas, custos, ativos e passivos, de que forma a governança acompanha o tema e como a sustentabilidade está integrada à estratégia e à gestão de riscos. A norma não exige que a empresa adote determinadas práticas, mas que seja transparente e consistente ao mostrar como esses fatores influenciam sua performance financeira.
Já a IFRS S2 é específica para mudanças climáticas e aprofunda a análise dos impactos do clima sobre as empresas. Assim, ela exige a divulgação de riscos físicos, como eventos climáticos extremos, secas ou enchentes, e de riscos de transição, como mudanças regulatórias, novas exigências legais, impostos, tecnologias e transformações de mercado associadas à economia de baixo carbono. Também prevê a divulgação de emissões de gases de efeito estufa e de informações sobre como o clima influencia a estratégia, o modelo de negócios e os investimentos da empresa.
Dessa forma, as IFRS S1 e S2 mudam a forma como sustentabilidade e clima entram nas decisões financeiras. Esses temas deixam de ser tratados como externalidades e passam a integrar oficialmente a análise de risco, o preço do crédito, o acesso a investimentos e o custo de capital.
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