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Especialistas reunidos na mesa-redonda Caminhos Para Sustentabilidade, realizada entre os dias 19 e 21 de fevereiro no campus de Goiabeiras da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), apontaram a bioeconomia, a produção circular, o consumo consciente, a transição energética e uma estratégia de longo prazo como vias essenciais para enfrentar a crise climática.
A atividade, que integrou a programação da Reunião Regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) no Espírito Santo, foi coordenada pelo professor Sérgio Lucena, do Departamento de Ciências Biológicas da Ufes e diretor do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA). Durante os debates, os participantes destacaram soluções práticas e desafios para transformar o modelo econômico e mitigar os impactos ambientais, com foco especial no contexto brasileiro.
Rodrigo Rollenberg, secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDICS), enfatizou a bioeconomia como um dos pilares centrais. Ele lembrou que o Brasil, com emissões de gases de efeito estufa concentradas no desmatamento e na agricultura, tem uma oportunidade única de reverter esse cenário por meio de grandes programas de restauração florestal e reflorestamento, transformando o setor que mais polui no que mais sequestra carbono.
“A ciência e a tecnologia são indispensáveis nesse processo”, afirmou Rollenberg, que está à frente da Estratégia Nacional de Bioeconomia e da elaboração de um Plano Nacional sobre o tema, prestes a entrar em consulta pública.
Ele sugeriu o incentivo ao cultivo de produtos como açaí, cupuaçu, babaçu e castanhas, além de madeiras e outros itens florestais, como forma de aliar desenvolvimento econômico e sustentabilidade. Outra frente destacada foi a redução da dependência de insumos químicos importados na agricultura, com o fortalecimento do setor de bioinsumos, que cresce 20% ao ano no país, mas ainda atende apenas 5% da demanda.
Já Elaine Cristina da Silva, professora e pesquisadora da Ufes na área de Gestão e Responsabilidade Socioambiental, trouxe o consumo consciente para o centro da discussão. Ela defendeu que a bioeconomia deve estar inserida em uma economia circular, com produtos mais duráveis e matérias-primas sustentáveis, o que exige avanços em pesquisa e desenvolvimento.
Para ela, a mudança também depende de uma nova mentalidade entre os consumidores, que precisam questionar os padrões de produção e optar por escolhas com menor impacto ambiental. “Sabemos que os produtos mais sustentáveis ainda são caros, mas podemos escolher outros com menos impacto negativo, e tudo começa na mentalidade”, reforçou a professora, destacando o papel ativo do consumidor na transformação da cadeia produtiva.
O planejamento de longo prazo foi a tônica da participação de Miguel Amado, professor da Universidade de Lisboa e especialista em planejamento ambiental. Ele defendeu uma visão estratégica que incorpore a bioeconomia e soluções baseadas na natureza, com as universidades desempenhando um papel crucial na formação de profissionais atentos à sustentabilidade.
“Precisamos que todos os que passam pelas universidades sejam formados na problemática da sustentabilidade. A Europa já conseguiu introduzir isso em todas as disciplinas”, observou Amado, sugerindo que o conhecimento multidisciplinar é essencial para moldar um futuro mais resiliente.
Por outro lado, Emmanuel Tourinho, ex-reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA) e membro do Núcleo de Teoria e Pesquisa do Comportamento, alertou para os impactos negativos de algumas soluções amplamente defendidas, como a transição energética. Ele citou o exemplo da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, construída há dez anos, que causou deslocamento de comunidades ribeirinhas e indígenas, prejuízos territoriais e perda de acesso a recursos essenciais à sua sobrevivência cultural.
Outro caso mencionado foram as fazendas de energia eólica no Nordeste, como no Rio Grande do Norte, Bahia e Piauí, onde geradores destroem aves planadoras e afetam voos migratórios, além de gerarem problemas de saúde para populações locais devido ao barulho excessivo dos equipamentos. “Precisamos de uma matriz energética mais limpa, mas nem sempre o que fazemos em nome disso é sustentabilidade”, ponderou Tourinho, chamando a atenção para a necessidade de avaliar os custos sociais e ambientais dessas iniciativas.
As apresentações e debates da mesa-redonda estão disponíveis na íntegra no canal da SBPC no YouTube, oferecendo acesso completo às reflexões e propostas levantadas pelos especialistas. O evento reforçou a urgência de ações integradas e bem planejadas para enfrentar a crise climática, combinando ciência, políticas públicas e participação social.
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